17 outubro 2013

Na varanda.


Veio num papel.
Não um papel qualquer, um meio pardo, amassado na varanda.

Sim, eu lembro que não temos varanda.
Mas se tivéssemos, ele teria sido encontrado lá.
Ainda assim havia um vaso de planta na porta. Sem plantas. Fiquei de luto quando nossa ráfia morreu seca de saudades suas e não a substitui.

O engraçado é que se você estivesse aqui diria que não foi secura de saudade, foi da minha desatenção em regá-la a causa da morte.
Eu, como de costume, iria rir sem argumentos.
Você não acharia graça, mas riria por mim. Ou de mim. Nunca decifrei aquele sorriso.

Mas não me tire a atenção com sua ausência, falava do papel.
Ou do que viria nele.

A notícia de um acidente de carro.
Tolo, assim como os que vemos todos os dias no telejornal local.
Sem sobreviventes para se aproximar ainda mais da realidade dessas tragédias diárias televisionadas.
Um amigo estava no meio.

Voltei a ler sobre os sobreviventes.
Procurei um tempo.
Ah!
Não constava essa palavra sem uma negativa antes.

Preciso dizer:
Não havia papel. Estou romanceando para reter qualquer coisa aqui dentro.

Eu ficava quieto quando queria chorar, você lembra disso?
Claro que lembra.
Você sempre perguntava se minha alergia estava atacada como fingido que não sabia.
Eu respondia que sim e você sorria de canto de boca atrás de mim quando eu não estava olhando.

Em segredo te digo:
Eu sempre estava olhando. E você sabia.

Morreu.
É o que falo quando me perguntam.
Frio?
Morreu. Faleceu. Partiu dessa pra melhor. Se foi. Nos deixou.
Qual a diferença?

- Tato, Márcio.
- Ele já morreu, não preciso mais me preocupar com nomenclatura.

Eu diria algo desse tipo, não é mesmo?
Fico intolerante à cortesias quando estou tentando ser forte.
Não me distraia.
Não consigo fazer essas duas coisas ao mesmo tempo.

Eu odeio me despedir.
E odeio a impossibilidade de fazê-lo.

Se eu pedir pra você ficar,
por hoje,
você fica?
A varanda está uma delícia hoje a noite...

Um comentário:

Mamãe coruja disse...

LINDO FILHO, um pouco triste. Só posso dizer, não morremos... apenas cumprimos o tempo determinado ou antecipamos por descuido nosso ou de alguns estupidos do transito.